Além do Censo: dicas para saber se uma empresa é inclusiva

Foto: Microsoft365/ Unsplash

Maite Schneider

A verdade que ninguém te conta é que nem toda empresa premiada com títulos e prêmios, tida como referência no que diz respeito às temáticas de Diversidade, Equidade e Inclusão, é verdadeiramente inclusiva.

Não basta o censo interno feito por essas empresas e nem o mapeamento das diversidades que apontam o que está avançando, se não atentarmos para várias questões. Abordo aqui alguns pontos importantes para que você saiba se, de fato, a empresa em que você está ou deseja trabalhar cumpre com esses quesitos.

PONTO 1:  Use o censômetro natural

O pescoço é o melhor censo que podemos ter. Olhe para a empresa e perceba: quantas pessoas negras existem? Onde elas estão? Estão construindo planos de carreiras? Estão na média e alta liderança? Estão nos conselhos? Quanto tempo ficam na empresa? Como é sua jornada lá dentro? Faça o mesmo para pessoas com deficiência, pessoas LGBTQIA+ , pessoas com mais de 50 anos, pessoas migrantes/refugiadas.

Desconfie de empresas, mesmo as premiadas, nas quais os grupos minorizados estão há décadas nas vagas iniciais ou de entrada e sem plano de carreira. Desconfie também das que possuem um turnover altíssimo desses grupos.

PONTO 2: Cuidado com times com chefes

Chefe é aquele que manda. Líder é aquele que comanda.

Mandar é seguir, sem ressalvas e com muita subserviência, a tudo que é colocado. Comandar é coordenar, com escuta ativa, olhar atento e com respeito pelo modo de cada pessoa ser, como indivíduo único e potente. Mandar é imputação. Comandar é administração.

Procure empresas onde as lideranças sejam capacitadas constantemente, não somente em hard skills, mas também em soft skills. Use o Linkedin para perguntar e saber quais líderes inspiram e por quais motivos. Entre nos perfis desses líderes e sinta como são, não somente nos seus posts, mas também nas interações que fazem. Os chefes nem precisam perder tempo procurando. Nada aprenderão.

PONTO 3: Analise a cultura organizacional e os processos existentes

Estude o passado da empresa, analise o presente e não acredite em tudo que ela diz que será no futuro. O futuro muitas vezes não chega ou, quando chega, chega pouco parecido com o que foi sonhado e idealizado.

Não acredite em todas as pesquisas de clima organizacional que são emitidas. Aliás, dados e números podem ser interpretados das mais variadas formas, a depender da intenção e do viés de quem os usa e para que fim os utiliza.

A melhor pesquisa organizacional é feita no cotidiano, quando notamos que as pessoas não ficam felizes somente com a despedida da sexta-feira, mas também se alegram com a chegada da segunda.

Confira se os códigos de conduta, ética, compliance e outros tantos são lindos somente na teoria ou se são colocados em prática também. Esses códigos são revistos com frequência? As pessoas colaboradoras são chamadas a participar de sua construção ou só os recebem como um “presente”? Até que ponto a inclusão vai além e chega ao pertencimento?

PONTO 4: Procure saber como a empresa trabalha o erro

Quando se trata de diversidade e de ampliar processos inclusivos, a maioria das empresas quer alcançar mais inovação para seus produtos e serviços. As pesquisas que temos sobre o assunto sempre abordam a inovação como uma potência da diversidade. Mas se falar de diversidades fosse sinônimo de falar de humanidades, todas as empresas deveriam ser exemplos de inovação. E sabemos muito bem que isso não acontece na prática.

Não é apenas a existência da diversidade que garante a inclusão. Somente quando conhecermos na essência o potencial que temos nos micro(colaboradores) teremos no macro o resultado que queremos em termos de inclusão real e efetiva.

Isso só é possível em empresas que deixam as pessoas serem quem são e promovem ambientes seguros e saudáveis para que cada pessoa colaboradora possa alcançar sua plenitude. E como humanos que somos, temos qualidades e pontos de melhoria, fortalezas e fraquezas, portanto, acertamos e erramos. A inovação, na grande maioria das vezes, não surge do acerto, mas do erro. A inovação surge do olhar desviado mais do que do olhar condicionado.

Fique alerta para empresas que buscam metas desumanas, absurdas, que só levam em conta o resultado do macro, sem considerar o micro que somos parte. Atente também para empresas que só buscam o acerto e onde o erro é tido como vergonha ou passível de demissões.

PONTO 5:  A empresa está mudando o mundo ou somente suas sedes e filiais?

Empresas não são bons produtos ou serviços. Ou melhor, não deveriam ser somente bons produtos e serviços. Empresas, em minha opinião, só deveriam existir se tivessem bons produtos e serviços.

Empresas verdadeiramente inclusivas usam seus bons produtos e serviços para fazer do mundo que vivemos um lugar melhor, mais humano e com menos desigualdades. Constroem mais pontes do que muros. Agem para além de si mesmas e pensam na sua rede de stakeholders, fornecedores e no seu entorno.

Empresas humanizadas colocam em prática o lema de que não é necessário que somente um lado envolvido ganhe, mas agem para que todos possam ganhar, percebendo que todos são fundamentais na construção da melhor empresa possível.

Agora me conta: que pontos você acha importantes para analisar se uma empresa é verdadeiramente inclusiva e acolhedora?

E não esqueça: não existe empresa ideal. Empresas são feitas de pessoas e precisamos melhorar muito nosso lado humano para, quem sabe um dia, termos empresas melhores e, consequentemente, sociedades mais humanas.

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Maite Schneider

Maite Schneider trabalha com Direitos Humanos desde 1990. Com MBA em Gestão Estratégica, Inovação e Conhecimento. é Linkedln Top Voice e coautora do livro “Diversidade, Equidade e Inclusão – Tornar simples o que parece complexo”. Cofundadora do projeto TRANSEMPREGOS (2013) e embaixadora da RME. Consultora e Mentora sobre Inclusão, Diversidade e Humanização. Cofundadora da Integra Diversidade – uma consultoria especializada em Inclusão e Diversidade - e da SOMOS Diversidade, é parte do Comitê Consultivo do Programa Municipal de DST/Aids e da Frente Parlamentar pelos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ do Estado de São Paulo.

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