Ato em homenagem a Marielle Franco em SP (15/03/2018). Foto: Romerito Pontes

Quatro propostas de Marielle Franco em prol das mulheres e da equidade de gênero

Assassinada 15 meses depois de tomar posse como vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL, Marielle Franco atuava na Câmara Municipal e nas ruas pelo direitos das mulheres, das pessoas negras e da população das favelas do Rio de Janeiro

*Por Lola Ferreira

  • 1. Ampliação do acesso ao aborto legal

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  • 2. Creches noturnas

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  • 3. Parto humanizado e prevenção da mortalidade materna

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  • 4. Combate ao assédio no transporte público

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  • Vereadora foi assassinada no centro do Rio

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O assassinato da vereadora Marielle Franco pôs fim a uma trajetória de luta contra as desigualdades e a violência policial e pela conquista de direitos da população mais vulnerável do Rio de Janeiro, especialmente mulheres negras e moradores de favelas. Durante seu curto mandato, Marielle levou para dentro da Câmara Municipal da capital fluminense pautas caras ao movimento de mulheres e ao movimento negro. Conheça algumas delas:

A vereadora Marielle Franco na Câmara Municipal do Rio. Foto: ASCOM / CMRJ

1. Ampliação do acesso ao aborto legal

Logo no início de seu mandato, Marielle apresentou o PL 16/2017, com objetivo principal de criar um programa de atenção humanizada ao aborto legal na cidade do Rio de Janeiro. A capital fluminense é a terceira do país em número de abortos por razões médicas e legais realizados, segundo o Ministério da Saúde. Entre janeiro de 2017 e janeiro de 2018, foram 86 procedimentos no Rio, 252 em Teresina e 349 em São Paulo. Em todo o país, foram 1.760 abortos legais no último ano.

O projeto apresentado na Câmara Municipal do Rio em fevereiro de 2017 por Marielle tem o objetivo de garantir às mulheres o direito de atendimento em casos de aborto necessário (se não há outro meio de salvar a vida da gestante), de gravidez resultante de estupro e de abortos autorizados por decisão judicial. Na justificativa, a vereadora argumentou que parte das mulheres dependentes da rede pública de saúde não tem acesso aos direitos relacionados ao aborto, e podem ter se submetido a procedimentos clandestinos.

Milhares de pessoas fizeram vigília em frente à Câmara Municipal do Rio no dia seguinte ao assassinato de Marielle. Foto: PSOL/RJ

As ações previstas no texto incluem capacitação das equipes que atendem casos de aborto legal na cidade, implementação do atendimento humanizado ao aborto legal em toda a rede obstétrica do município, oferecimento de atendimento psicológico à mulher e aos profissionais e criação de campanha para educar e sensibilizar profissionais e mulheres sobre o serviço.

2. Creches noturnas

Marielle também apresentou, junto com o vereador Tarcísio Mota (PSOL-RJ), o PL 17/2017, que prevê atendimento nas creches do município no horário de 17h às 23h para crianças de seis meses a cinco anos. Objetivo é atender famílias em que os pais trabalhem à noite, sem deixar de atender as crianças no turno regular. O espaço, segundo o PL, será destinado aos pais e mães que comprovarem o trabalho ou atividade acadêmica no horário noturno. Assim, as crianças ficariam em um espaço apropriado e seguro.

As mulheres seriam as mais beneficiadas por um projeto de lei que atendesse seus filhos no período noturno. De acordo com dados de 2017 do IBGE, 34,6% das brasileiras em idade apta para trabalhar se encontram ocupadas em tempo parcial, e uma das razões, segundo o instituto, é que elas não têm com quem deixar seus filhos – os homens nessa condição são 19,1%. Além disso, as mulheres dedicam em média 18 horas por semana para os afazeres domésticos ou cuidados com outras pessoas, 73% mais tempo do que as 10,5 horas semanais dedicadas pelos homens.

Manifestação em homenagem a Marielle diante da Alerj no dia seguinte à sua morte. Foto: Mídia Ninja

3. Parto humanizado e prevenção da mortalidade materna

Com projeto assinado pela Comissão da Mulher da Câmara Municipal, presidida por Marielle, e pelos vereadores David Miranda (PSOL), Luciana Novaes (PT), Paulo Pinheiro (PSOL), Vera Lins (PP), Tânia Bastos (PRB) e Cesar Maia (DEM), entrou em vigor no dia 21/11/2017 a lei 6.282/2017. A lei estabelece um programa para a criação de mais casas de parto no Rio de Janeiro. Atualmente, só há em funcionamento a casa David Caspitrano Filho, em Realengo, na zona oeste do Rio de Janeiro.

Segundo a justificativa do projeto, a casa realizou cerca 3.000 partos nos últimos 13 anos, e no período não houve nenhuma morte relacionada a causas maternas. O programa “Centro de Parto Normal e Casa de Parto” prevê em até cinco anos criar novos espaços similares em todas as regiões da cidade, com atendimento humanizado e exclusivo ao parto normal.

Sessão em homenagem a Marielle Franco na Câmara dos Deputados em 15/03/2018. Foto: Lula Marques

Os partos tipo cesárea ainda são maioria na cidade do Rio. Em todo o ano de 2017, foram realizados 42.709 nascimentos nesta modalidade, 13% a mais do que os 37.281 partos normais assistidos. No mesmo período, as mulheres negras foram maioria no índice de mortalidade materna. A capital fluminense registrou 2.242 mortes maternas, 60% delas de mulheres negras (1.345). A lei prevê capacitação dos profissionais de saúde e acompanhamento da Secretaria Municipal de Saúde para garantir a qualidade do atendimento à mulher, com o objetivo de reduzir os índices de mortalidade materna.

4. Combate ao assédio no transporte público

O projeto de lei 417/2017, também de autoria de Marielle, pretende criar uma campanha de enfrentamento ao assédio sexual no município do Rio. O PL prevê a formação dos servidores para auxiliar na prevenção do assédio e a criação de campanhas educativas sobre o tema no transporte público. “O  transporte é público, o corpo das mulheres não! Em caso de assédio sexual, denuncie. Ligue 180”, diz um dos textos previstos no projeto para divulgação na campanha.

Segundo o último Dossiê Mulher, do Instituto de Segurança Pública do Estado do Rio, em 2016 o Estado registrou 588 casos de “importunação ofensiva ao pudor” e 91% das vítimas deste tipo de crime são mulheres. Elas também são maiorias nos crimes de assédio sexual: dos 126 casos registrados, 93% das vítimas são mulheres. Somados ambos os crimes, 70% deles ocorreram em transportes coletivos ou locais e vias públicos.

Sessão na Câmara dos Deputados em homenagem a Marielle (15/03/2018). Foto: Marcelo Camargo / Ag. Brasil

Vereadora foi assassinada no centro do Rio

Marielle Franco foi eleita em outubro de 2016 para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro com 46.502 votos – a quinta vereadora mais votada, pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade). Depois de 15 meses dos 48 previstos, seu primeiro mandato foi interrompido na noite do dia 14 de março, uma quarta-feira, na região central do Rio. Em uma aparente execução, Marielle foi atingida por quatro dos 13 tiros disparados contra seu carro. Além da parlamentar, o motorista que conduzia o veículo, Anderson Pedro Gomes, também foi atingido pelos disparos e morreu na hora. Uma assessora de Marielle que também estava no carro ficou ferida.

*Lola Ferreira é jornalista e colaboradora da Gênero e Número.

Lola Ferreira

Formada pela PUC-Rio, foi fellow 2021 do programa Dart Center for Journalism & Trauma, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Escreveu o manual de "Boas Práticas na Cobertura da Violência Contra a Mulher", publicado em Universa. Já passou por Gênero e Número, HuffPost Brasil, Record TV e Portal R7.

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