Fábio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

Mulheres e pessoas negras têm menor renda e são maioria entre desempregados no Brasil

Homens tiveram rendimento 24% maior do que o das mulheres e brancos ganharam 44% a mais do que pretos no fim de 2017; já nos últimos cinco anos, renda dos brancos teve aumento duas vezes maior do que aumento da renda dos pretos, mas mulheres viram renda crescer mais do que homens no mesmo período

*Por Lola Ferreira

No fim de 2017, 13,4% do total de mulheres em idade de trabalhar estavam desempregadas, enquanto 10,5% dos homens estavam na mesma situação, constatou a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) trimestral do IBGE (Instituto Brasileiro de Pesquisa e Estatística). O desemprego no último trimestre do no passado afetava 14,5% das pessoas pretas, 13,6% das pessoas pardas e 9,5% das pessoas brancas. A taxa geral de desocupação no país era de 11,8%, o que coloca mulheres e pessoas negras acima da média nacional.

 

 

grafico (16)

 

 

Homens e pessoas brancas também estão à frente de mulheres e pessoas negras em relação ao rendimento mensal. No recorte por sexo feito pelo IBGE, os homens ganharam no fim de 2017 em média R$ 2.476, contra R$ 1.884 das mulheres, o que significa uma diferença de 23,9% a mais no rendimento deles. Brancos ganharam em média R$ 2.896, enquanto pretos e pardos ganharam R$ 1.615 – uma diferença de 44% a mais para os brancos.

Além da diferença nos valores, pessoas negras também têm desvantagem em relação à tendência de aumento da renda. O rendimento médio de pessoas brancas cresceu 5% em cinco anos, enquanto o de pessoas pretas cresceu 2%.

 

 

grafico (14)

 

 

Já o crescimento da renda das mulheres superou o dos homens entre os últimos três meses de 2012 e de 2017: o rendimento delas aumentou 9,2%, enquanto o deles subiu 6,6%. No entanto, entre os quartos trimestres de 2016 e de 2017, o rendimento médio dos homens foi acrescido de R$ 71 – um aumento de 2,9% – e o das mulheres ficou caiu R$ 1, ficando virtualmente estagnado.

 

 

grafico (11)

 

 

O Estado do Brasil com maior diferença salarial em detrimento das mulheres no período foi São Paulo, onde os homens ganham 33,8% a mais. O Amapá foi o único estado igualitário entre homens e mulheres em relação ao rendimento no fim de 2017: foram R$ 2.032 para os homens e R$ 2.030 para as mulheres, uma diferença de 0,1%.

O IBGE não divulgou o cruzamento das categorias sexo e raça na PNAD, portanto não é possível saber a situação específica das mulheres negras, por exemplo, em relação a trabalho e desocupação.

 

 

grafico (20)

Ações públicas e privadas contra a disparidade

Outro dado relevante na PNAD trimestral é o índice de mulheres e homens fora da força de trabalho, que o IBGE considera como pessoas que não trabalharam nem buscaram trabalho na semana que referência da pesquisa. Desde 2012, as mulheres são cerca de 66% das pessoas nessa categoria.

“Há uma sobrecarga sobre a mulher, principalmente em relação aos cuidados com os filhos, que faz com que ela se afaste algumas vezes do trabalho”, disse à Gênero e Número a diretora de políticas públicas do Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa, Ciência e Tecnologia de São Paulo (SinTPq), Maria Felomena Cássia de Jesus dos Santos. “Os chefes olham esse tipo de coisa quando analisam quem demitir. Uma saída para o problema é tentar forçar o compartilhamento no ambiente de trabalho, ser dividida a liberação para levar um filho ao médico, por exemplo. Algo que proteja um pouco a relação da mulher com a empresa”, sugere.

Marcello Casal Jr/ABr

Santos, que trabalha como analista no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), acredita que a falta de tempo para as mulheres se especializarem e progredirem na vida profissional contribui para a disparidade salarial. Ela sugere maior participação do governo em políticas que auxiliem na mudança.

“O governo federal poderia contribuir com incentivo à especialização da mulher, envolvendo o Estado e as prefeituras. Tem muitas mulheres domésticas, por exemplo, que sonham em cursar faculdade. Então tem de haver um incentivo à escolaridade dessa mulher, que naturalmente vai crescer mais. Uma mulher pode querer se especializar até na própria área, mas a especialização vai aumentar sua renda e deixar essa média [de rendimento] mais igual”, afirma.  

Para Tânia Fontenele, economista e coordenadora do Instituto de Pesquisa Aplicada da Mulher, a diferença salarial entre mulheres e homens também acontece por conta das maiores dificuldades que elas enfrentam para ascender profissionalmente.

 

 

grafico (17)

 

 

“A partir do momento em que os cargos são importantes, as mulheres têm um percentual muito pequeno de ocupação. A discussão tem que ser feita dentro das organizações de trabalho, para todo o sistema. Os dirigentes têm de estar cientes desses dados, porque há o teto. As mulheres veem a possibilidade de entrar no mercado, se esforçam, mas têm um teto de salário e de reconhecimento em termos de cargos”, enfatiza Fontenele.

As mulheres também são maioria em outros índices negativos em relação à geração de renda. Do total de mulheres em idade de trabalho, 20,9% delas ou estão desempregadas ou trabalham uma quantidade insuficiente de horas – nesta categoria se encaixam pessoas que trabalham menos do que 40 horas por semana e estão disponíveis para trabalhos complementares. Ou seja, são pessoas que querem trabalhar mais do que trabalham atualmente. Os homens que se encaixam nessa categoria, somados aos desocupados, são 15,6% daqueles em idade de trabalho. Em 2012, homens desocupados ou com insuficiência de horas eram 10,4%, e as mulheres nesta categoria eram 14,8%.

 

 

grafico (13)

 

 

Fontenele credita o fato de as mulheres figurarem como maioria neste cenário à precarização do trabalho delas e ao machismo de empregadores.

“Em uma crise econômica, os empregos precarizados são os mais penalizados. E como muitas mulheres estão neste tipo de economia, elas são as mais penalizadas. São estigmatizadas, mesmo. Tem uma questão clara de gênero, porque sempre dão preferência ao homem, porque a mulher pode engravidar ou já tem seus filhos. Há muito corporativismo entre homens, que escolhem uns aos outros, embora as mulheres já tenham comprovado a sua excelência”, acredita.

Para a economista, o caminho para mudar o atual cenário passa pela consciência dos empregadores, que podem tomar atitudes concretas, contratando mais mulheres. “Organizações que investem na equidade de gênero têm força para mudar o cenário. Investir em uma sociedade mais justa e equiparada entre homens e mulheres muda tudo, tudo melhora”, diz.

*Lola Ferreira é jornalista e colaboradora da Gênero e Número.

Dados abertos: acesse aqui as tabelas da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Trimestral – PNADC/T do IBGE.

http://www.generonumero.media/apoie/

Lola Ferreira

Formada pela PUC-Rio, foi fellow 2021 do programa Dart Center for Journalism & Trauma, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Escreveu o manual de "Boas Práticas na Cobertura da Violência Contra a Mulher", publicado em Universa. Já passou por Gênero e Número, HuffPost Brasil, Record TV e Portal R7.

Se você chegou até aqui, apoie nosso trabalho.

Você é fundamental para seguirmos com o nosso trabalho, produzindo o jornalismo urgente que fazemos, que revela, com análises, dados e contexto, as questões críticas das desigualdades de raça e de gênero no país.

Somos jornalistas, designers, cientistas de dados e pesquisadoras que produzem informação de qualidade para embasar discursos de mudança. São muitos padrões e estereótipos que precisam ser desnaturalizados.

A Gênero e Número é uma empresa social sem fins lucrativos que não coleta seus dados, não vende anúncio para garantir independência editorial e não atende a interesses de grandes empresas de mídia.

Quero apoiar ver mais