Mulheres fazem caminhada em solidariedade às vítimas de feminicídio | Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Dados e transparência sobre violência contra a mulher têm futuro incerto no Rio

Descontinuidade da Secretaria de Segurança pelo governador eleito Wilson Witzel pode afetar órgão que estrutura e reporta publicamente estatísticas de feminicídio no Estado

Por Lola Ferreira*

Na última terça-feira (13), o governador eleito do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, confirmou a extinção da Secretaria de Segurança, o que fora uma das suas principais promessas de campanha, e anunciou que ela será desmembrada em duas pastas: Secretaria de Estado da Polícia Civil e Secretaria de Estado da Polícia Militar. No mesmo dia, a Gênero e Número entrou em contato com a equipe de transição para entender se ainda existirá e onde ficará alocado o Instituto de Segurança Pública (ISP) do Rio, autodefinido como a principal instituição pública de transparência dos dados sobre segurança do Estado. Não houve resposta assertiva.

Por telefone, Eduardo Carvalho, um dos assessores da equipe de transição, informou que o ISP pode ser alocado em uma das polícias. “Ainda estamos vendo”, disse de forma evasiva. “A transição tem muita coisa factual para resolver, mas o que temos sobre a segurança até agora é isso”, explicou. “Pode ficar dentro de uma das polícias”, disse.

[+] Leia mais: Prestação de contas das campanhas 2018 revela baixa prioridade dos partidos para impulsionar mulheres negras

Aliado na luta contra a violência de gênero

O ISP é responsável há 12 anos por produzir o Dossiê Mulher, principal publicação com dados estatísticos do Estado sobre crimes como estupro e feminicídio. De acordo com a lei 4.785/2006, o Poder Executivo é obrigado a elaborar tais estatísticas, e é o Dossiê Mulher que sistematiza o perfil da vítima e do agressor, assim como onde acontecem os crimes, e que analisa ainda quais crimes contra patrimônio tiveram motivação de gênero.

Em 2016, o instituto criou uma plataforma para visualização interativa dos dados e mensalmente divulga o balanço mensal dos registros. Em parceria com a Defensoria Pública, a equipe que produz o dossiê conseguiu, no último ano, disponibilizar a quantidade de medidas protetivas expedidas e cumpridas no Estado.  A partir de agora, com o anúncio da extinção da Secretaria de Segurança, a continuidade e a evolução do trabalho do ISP relacionado à transparência dos dados são incertas.

A pauta de Segurança Pública de Witzel gira em torno de fortalecimento das polícias, mas não destaca o enfrentamento à violência contra a mulher. De acordo com o plano de governo, a única ação em relação ao tema prevista é o aumento de delegacias especializadas, que não é detalhada. Quantas seriam e em quais localidades são informações por ora em aberto. Seu planejamento também aponta que a Polícia Civil “ficará responsável pela elaboração das estratégias de combate à criminalidade a partir das informações colhidas por seus agentes”, mas sem detalhar se tais estratégias seriam baseadas na metodologia já utilizada pelo ISP. Carvalho também não soube informar.

Em contato com a Gênero e Número por telefone, a assessoria de imprensa do ISP reiterou que a principal função do órgão é catalogar os dados para subsidiar políticas públicas de segurança. Sobre 2019, o assessor Lucas Lacerda explicou que não seria prudente fazer análises futuras mas afirma que “a princípio o instituto segue fazendo suas atividades”. “Está em aberto, e a competência da definição é da equipe da transição”, afirmou.

*Lola Ferreira é jornalista e colaboradora da Gênero e Número.

Lola Ferreira

Formada pela PUC-Rio, foi fellow 2021 do programa Dart Center for Journalism & Trauma, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Escreveu o manual de "Boas Práticas na Cobertura da Violência Contra a Mulher", publicado em Universa. Já passou por Gênero e Número, HuffPost Brasil, Record TV e Portal R7.

Se você chegou até aqui, apoie nosso trabalho.

Você é fundamental para seguirmos com o nosso trabalho, produzindo o jornalismo urgente que fazemos, que revela, com análises, dados e contexto, as questões críticas das desigualdades de raça e de gênero no país.


Somos jornalistas, designers, cientistas de dados e pesquisadoras que produzem informação de qualidade para embasar discursos de mudança. São muitos padrões e estereótipos que precisam ser desnaturalizados.

A Gênero e Número é uma empresa social sem fins lucrativos que não coleta seus dados, não vende anúncio para garantir independência editorial e não atende a interesses de grandes empresas de mídia.

Quero apoiar ver mais