Deputados discutiram rumos da educação em São Paulo, com destaque para temas que marcaram campanha em 2018 | Foto: Jeduca / Divulgação

Em congresso internacional, deputados federais atuantes na educação voltam ao debate sobre ideologia e gênero

Os deputados federais Caroline de Toni (PSL/SC), Tabata Amaral (PDT/SP) e Pedro Cunha Lima (PSDB/PB) se reuniram na mesa “A visão do novo Congresso sobre educação”

Da Redação Gênero e Número

O cenário de incertezas na educação em 2019, quando cortes de orçamento para instituições públicas ainda são a notícia mais impactante para a área, faz com que seja relevante promover debates públicos, sobre desafios e possibilidades, a partir da visão de quem está no dia a dia em Brasília trabalhando em comissões ou em projetos de lei relacionados à educação. 

Nesta semana, no Congresso Internacional de Jornalismo na Educação, realizado em São Paulo, três jovens parlamentares que tiveram a educação como plataforma de campanha nas eleições 2018 debateram o momento. Os deputados federais Caroline de Toni (PSL/SC), Tabata Amaral (PDT/SP) e Pedro Cunha Lima (PSDB/PB) — presidente da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados — se reuniram na mesa “A visão do novo Congresso sobre educação”, mediada pelo repórter especializado em educação Paulo Saldaña, da Folha de S. Paulo. 

Dando o tom do que tem sido este ano para a educação pública até o momento, o principal foco do debate ficou sobre a abordagem ideológica assumida pelo Ministério da Educação (MEC) e seus braços de atuação para o campo da educação pública. “O governo atual tem uma alta carga ideológica. Mas as soluções não vêm com carga ideológica”, criticou Cunha Lima.

O debate sobre a presença dos temas gênero e sexualidade em sala de aula foi colocado, com visível alinhamento de Tabata e Cunha Lima em um posicionamento e De Toni em outro. A deputada catarinense defende a versão bolsonarista de que houve um “kit gay” desenvolvido pelo governo federal. Para ela, o material de educação sexual desenvolvido por ONGs especializadas a pedido da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados via MEC entre o segundo governo Lula e o primeiro governo Dilma continha conteúdos que não convém a escola apresentar aos estudantes.

“A família ainda deve ser a protagonista dos valores, o Estado não pode impor seus valores, destruindo os da família”, disse. Quando questionada se não deveria, então, haver conteúdo sobre educação sexual, ela reforçou: “Precisamos definir se é a família ou o Estado que tem direito a definir os valores que se quer passar às crianças, pois se é o Estado, isso se trata de doutrinação”.

O material em questão, apelidado pela direita como “kit gay”, é a cartilha “Aparelho sexual e cia”, que tinha como objetivo abordar a “não-discriminação por orientação sexual”, e que já havia rendido bastante no enfrentamento das campanhas entre direitas e esquerda durante toda a eleição de 2018. 

De Toni encerrou o assunto se colocando como uma conservadora liberal, indicando que debates sobre sexualidade e gênero não cabem à escola, mas que “ao se tornar consciente das suas próprias escolhas, o jovem, o adolescente, tem todo o direito de assumir o caminho que quiser, na orientação sexual ou na identidade de gênero”.

O debate sobre a presença dos temas gênero e sexualidade em sala de aula foi colocado, com visível alinhamento de Tabata e Cunha Lima em um posicionamento e De Toni em outro | Foto: Jeduca / Divulgação

A deputada Tabata Amaral destacou sua vivência para rebater o conservadorismo de De Toni, ao relatar que, tendo crescido em uma família de baixa renda na periferia de São Paulo, foi na escola que teve acesso a informações importantes sobre temas diversos, incluindo aqueles relacionados à saúde reprodutiva e à sexualidade, e que essa é a realidade de milhares de estudantes. 

“Eu tenho muito incômodo com a possibilidade de que no debate político a gente perca a noção do que é o Brasil. Precisamos lembrar que grande parte dos abusos contra crianças acontece dentro de casa, e esse tipo de debate também é educação sexual que pode prevenir abusos”, disse ela. “A gente ainda é um país muito pobre, se não é a escola que explica o que é o abuso, muita gente não vai ter acesso a isso, e se há incômodo sobre a abordagem que tem sido usada para isso, que se mude essa abordagem, se amplie, em nome da pluralidade”, completou.

Foi com o gancho da pluralidade que Cunha Lima voltou a defender que há questões centrais a serem priorizadas na educação brasileira e afirmou que a comissão que ele preside não pretende se ocupar de questões ideológicas, inclusive porque ao se falar de “valores da família brasileira” seria importante também perguntar que valores são esses, já que há muitos modelos de família. 

Ele destacou a carência de creches no país e a dificuldade de se definir um modelo de gestão efetivo para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Sobre este último tema, afirmou que há expectativas para estabelecimentos de novas formas diretrizes a partir de 2020.

Lola Ferreira

Formada pela PUC-Rio, foi fellow 2021 do programa Dart Center for Journalism & Trauma, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Escreveu o manual de "Boas Práticas na Cobertura da Violência Contra a Mulher", publicado em Universa. Já passou por Gênero e Número, HuffPost Brasil, Record TV e Portal R7.

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