Parte da atual bancada feminina na Câmara Federal; Em 2018, deputadas e candidatas à reeleição devem ter prioridade no acesso ao Fundo das mulheres. Foto: Richard Silva/PCdoB na Câmara

Brigando por espaço nos partidos, candidatas vão acessar receita inédita neste ano

Assim como já observado em 2014, tendência é que mulheres que concorrem ao cargo de deputada federal fiquem com maior parte do repasse do Fundo Partidário feito para atividades de mulheres nas legendas

Por Giulliana Bianconi e Natália Leão* 

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Pela primeira vez, as mulheres candidatas vão poder reivindicar nos seus partidos, amparadas pela legislação, uma expressiva fatia do dinheiro público que é utilizado em campanhas e atividades eleitorais pelas legendas em todo o Brasil. Dos R$ 888,7 milhões do Fundo Partidário aprovados pelo Congresso no Orçamento da União deste ano, elas podem pleitear 30%, ou quase R$ 267 milhões. Até março, o cenário era outro. Existia um teto estabelecido desde a minirreforma eleitoral de 2015 para o repasse do Fundo Partidário para atividades de mulheres nos partidos. Era de 15%, com um mínimo permitido de 5%.

A mudança veio após o Supremo Tribunal Federal deliberar sobre o assunto, promover votação de ação levada à Corte pela Procuradoria Geral da República e, por 8 votos a 2, definir que as mulheres devem acessar mais dinheiro do Fundo. Embora toda e qualquer candidata possa reivindicar suporte do seu partido e repasse dessa verba, a Gênero e Número apurou junto a lideranças das Secretarias de Mulheres dos partidos que a prioridade de investimento em boa parte das legendas será para eleger deputadas federais e para reeleger quem já tem cargo. São as secretarias as responsáveis por receber a quantia repassada às mulheres e distribuir internamente entre elas. Em 2014, o direcionamento para candidatas que pleiteavam vaga na Câmara Federal já foi uma tendência, como é possível ver a partir dos dados declarados pelos próprios partidos ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na prestação de contas final daquele ano. De 32 siglas registradas para aquele pleito, pelo menos 15 direcionaram para as candidatas a deputada federal a maior parcela do dinheiro que foi para atividades eleitorais de mulheres. A porcentagem total gasta em cada partido para a corrida eleitoral delas variou de 0,01% (PSD) a 14% (PTN).

 

 

O PT foi a sigla com maior Fundo Partidário no acumulado de 2014 – R$ 69 milhões, de acordo com os dados do TSE. A legislação estabelece que 5% do total do Fundo devem ser divididos entre todos os partidos registrados e com prestação de contas em dia, enquanto os outros 95% devem ser distribuídos de acordo com os votos obtidos nas eleições gerais mais recentes para a Câmara. Com uma bancada e votação expressivas nas eleições anteriores, o partido acumulou a maior parte do bolo, seguido pelo PMDB e pelo PSDB. No PT, inclusive, todo o dinheiro direcionado para as mulheres foi destinado às campanhas de deputada federal. Isso ocorreu também em pelo menos outros 10 partidos.

 

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Em 2018, o tamanho da bancada na Câmara Federal se tornou ainda mais importante (veja aqui quantas deputadas foram eleitas em cada partido nas eleições gerais de 2014). É que foi aprovado, no fim de 2017, um segundo Fundo, o Eleitoral, sob a cifra de R$ 1,7 bilhão. O Congresso definiu em outubro passado as regras para a distribuição desse montante, e mais uma vez a presença do partido na Câmara vai pesar na distribuição do dinheiro: 35% do Fundo Eleitoral vai para partidos com pelo menos um deputado(a), e proporcionalmente aos votos obtidos por eles na última eleição. Outros 48% seguem para partidos na proporção do número de deputados na Câmara.

Para o Fundo Eleitoral não foi estabelecida, por lei, qualquer divisão do valor entre gêneros até o momento. Mas o assunto está pautado, como contou em entrevista a Gênero e Número a advogada Lígia Fabris, que esteve defendendo, no Supremo Tribunal Federal, na condição de amicus curiae (amiga da corte), a queda do teto de 15% de repasse do Fundo Partidário para as atividades de mulheres. Fabris revelou que após o STF decidir a favor da queda do teto, foi aberta uma consulta ao TSE que pressiona para que os parâmetros fixados pela Corte para o Fundo Partidário se apliquem também ao Fundo Eleitoral. “Acredito que o TSE responderá que sim”, aposta Lígia.

Nos partidos, o assunto também está em alta. A deputada federal Erika Kokay (PT-DF), que tentará a reeleição em outubro e o terceiro mandato consecutivo afirmou que o assunto está na pauta da próxima reunião de mulheres, agendada ainda para a primeira quinzena de abril. “Nessa primeira eleição com o Fundo Eleitoral, não podemos reconduzir a lógica de exclusão das mulheres, e não temos, nós mulheres do partido, nenhuma disposição de flexibilizarmos [nesse repasse] e vermos novamente um parlamento com imensa sub-representação feminina”, afirmou. Embora em 2014 ela tenha sido eleita após uma campanha de contou com expressiva doação de pessoas físicas (o partido repassou R$ 237 mil do total dos R$ 823 mil declarados por ela) e pretenda reeditar o formato de arrecadação, Kokay tem a expectativa também de acessar os fundos.

Érika Kokay: "Não podemos reconduzir a lógica de exclusão das mulheres". Foto: San Rogê / CAUBR

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Pré-candidata à Câmara Federal, a presidente nacional do PSC Mulher, Denise Assumpção, foi uma das que estiveram presentes ao Fórum Nacional de Mulheres de Partidos, realizado em março, em Brasília. Na ocasião, ela levantou um dos desafios, que foi validado pela maioria das mulheres presentes – havia parlamentares, secretárias de partidos e pré-candidatas:  “A gente não consegue muitas vezes nem acessar a prestação de contas”. O PSC conta com apenas uma mulher na Câmara Federal. No encontro suprapartidário, a secretária nacional de mulheres do PSB, Dora Pires, afirmou que nesta eleição “vamos ver o maior enfrentamento, pois as mulheres vão reivindicar muito mais os direitos nos partidos e junto ao TSE.”

O Tribunal Superior Eleitoral tem promovido campanhas e ações em parcerias com a sociedade civil e com a Procuradoria da Mulher – órgão criado no Senado, em 2013 –  para estimular a presença de mais mulheres na política. Está previsto para maio um evento em parceria com a ONU Mulheres para marcar a centralidade do tema na pauta do Tribunal.

Fontes permitidas

Além dos fundos, as candidatas podem custear suas campanhas com autofinanciamento, doações de pessoas físicas, com campanhas de financiamento coletivo, com comercialização de bens e serviços. Não é mais permitido o financiamento por empresas.

*Giulliana Bianconi é jornalista e codiretora da Gênero e Número
*Natália Leão é doutoranda em Sociologia pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESPUERJ) e colaboradora da Gênero e Número.

Lola Ferreira

Formada pela PUC-Rio, foi fellow 2021 do programa Dart Center for Journalism & Trauma, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Escreveu o manual de "Boas Práticas na Cobertura da Violência Contra a Mulher", publicado em Universa. Já passou por Gênero e Número, HuffPost Brasil, Record TV e Portal R7.

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