Parlamentar mais jovem da Câmara vai comandar discussão sobre Estatuto do Nascituro em Comissão

Aos 22 anos, a presidente da Comissão de Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados, Luisa Canziani, diz que pretende fazer mediação entre direita e esquerda para debater aborto e outros temas centrais para a agenda das mulheres

Por Vitória Régia da Silva*

Luisa Canziani (PTB/PR) é a presidente da Comissão em Defesa dos Direitos da Mulher| Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Eleita com 90 mil votos, a parlamentar mais jovem da Câmara dos Deputados, Luisa Canziani (PTB/PR), foi também escolhida para a presidência da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (CMulher), uma das 25 comissões permanentes da Casa. Aos 22 anos, ela é filha do ex-deputado paranaense Alex Canziani, que, após cinco mandatos na Câmara, não conseguiu se eleger para o Senado em 2018. Por sua comissão passará o Estatuto do Nascituro, projeto de lei que determina que a vida começa a partir da concepção e proíbe o aborto em qualquer caso.

A deputada se diz favorável à legislação atual sobre a interrupção da gravidez (permitida em caso de estupro, risco de vida para a gestante e geração de feto anencéfalo), e se coloca como mediadora entre lados opostos da polarização política: “As pautas das mulheres não são pautas da direita ou da esquerda, conservadoras ou não, mas são projetos do país”. Em conversa com a Gênero e Número, ela também falou sobre o planejamento da CMulher e sobre seu posicionamento sobre questões relevantes para os direitos das mulheres.

Leia a seguir trechos da entrevista.

Gênero e Número: O Estatuto do Nascituro (PL 478/2007), projeto de lei que inviabiliza o aborto legal, entre outras medidas, deve voltar à pauta da CMULHER este ano. O ex-relator do texto, Diego Garcia (Podemos-PR), já deu parecer favorável à matéria, defendida pela ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves. Qual seu posicionamento sobre o projeto?

Nós estamos avaliando e precisamos ainda decidir sobre a nova relatoria, porque vários deputados demonstraram interesse nessa matéria.  Vamos escolher um relator e dar prosseguimento a essa questão. Em relação ao aborto, eu sou favorável à legislação vigente. Como presidente da Comissão da Mulher, eu não tenho o direito de colocar os meus posicionamentos à frente da liderança, muito pelo contrário, eu tento sempre trazer uma posição de equilíbrio. Sou progressista e tento dialogar com os dois lados. Acho que a gente precisa de parlamentares assim no Congresso, porque as pautas das mulheres não são pautas da direita ou da esquerda, não são pautas conservadoras ou não, mas são projetos do país. Por isso, eu sempre tenho uma posição de mediadora, conversando com os dois lados, para que juntos criemos uma agenda parlamentar comum em prol das mulheres.

As pautas ligadas a educação e tecnologia foram as mais defendidas durante sua campanha. Qual o seu posicionamento sobre a discussão de gênero e sexualidades nas escolas e sobre projetos como o Escola sem Partido?

Como ainda não há um projeto específico em andamento nas comissões da Câmara, estamos aguardando para ver quais são as perspectivas. [O projeto mais recente, apresentado pela deputada Bia Kicis (PSL/DF) este ano, espera para ser distribuído entre as comissões e, posteriormente, pode ser levado à votação em plenário]. Mas na minha visão, temos vários problemas e desafios na educação brasileira. O maior deles é a aprendizagem. Temos um problema de alfabetização, precisamos discutir a primeira infância, a implementação da reforma do Ensino Médio e debater o Fundeb [O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação é uma das principais fontes de financiamento dos municípios e estados do país, e a Câmara dos Deputados discute se ele continuará vigente depois de 2020]. Sou uma grande entusiasta das áreas de educação e tecnologia. Ambas continuarão a estar entre as pautas de minha legislatura. As mulheres são mais escolarizadas que os homens, mas em ciências exatas e biológicas elas não representam a maioria. Sem dúvida precisamos discutir essas questões.

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Audiência pública realizada em abril na Comissão da Defesa dos Direitos da Mulher sobre as perspectivas de atuação futura do Ministério da Mulher.  Da esquerda para a direita: Tia Eron, secretária de Políticas para Mulheres; Damares Alves, Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; Luisa Canziani, presidente da Comissão e Emmanuel Pinheiro Neto, vice-presidente da Comissão | Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Por que quis ocupar a presidência da Comissão da Defesa dos Direitos da Mulher?

Como mulher, parlamentar e deputada mais nova dessa legislatura,  e como presidente de comissão mais jovem da história do país, é muito simbólico o lugar que ocupo. Tenho mais que compromisso, tenho o dever de lutar por questões das mulheres e muito especialmente pela participação delas na política. Nós tivemos, na última eleição, o maior número de deputadas eleitas da história, mas ainda é muito pouco, visto que somos a maioria da população, a maioria do eleitorado e mais escolarizadas que os homens. Essas pautas sempre estiveram comigo na militância do partido, para incentivar a participação de mulheres na  política.

Quais os desafios e obstáculos de ser uma deputada jovem e mulher ocupando espaços da política?

É muito  significativo para a minha trajetória, dentro do meu estado, ser a parlamentar mais nova desta legislatura. Mas ainda temos vários paradigmas  a serem quebrados. Principalmente no sentido de mostrar que uma jovem mulher é plenamente capaz de fazer um mandato com excelência. Pretendo fazer isso com muito trabalho, dedicação e com uma equipe competente, tomando algumas ações inovadoras.

Qual a importância de debater os direitos das mulheres na Câmara?

Uma das minhas missões como presidente é trazer um protagonismo maior para a Comissão da Mulher. Ela tem pautas relacionadas não só às parlamentares e às mulheres, mas a toda a sociedade. Porque afinal não estamos discutindo só questões da mulher, mas pautas das famílias e de todo cidadão brasileiro. Era esse olhar que eu queria trazer para a Comissão.

Em quais questões precisamos avançar quando falamos em direitos da mulher?

Nossos eixos permanentes de discussão serão feminicídio, violência contra a mulher e saúde. São temas centrais e que sempre estiveram em debate tanto na Comissão quanto nesta Casa. Mas, nessa legislatura, a Comissão vai ter um olhar um pouco diferente, que dividimos em três eixos. Inclusive, somos a primeira comissão da Casa a fazer um planejamento estratégico, construído com deputadas e deputados, funcionários e entidades, para traçar os rumos e as diretrizes deste ano de atuação. E óbvio, esses temas centrais jamais irão sair de pauta, mas vamos trazer outras três questões muito específicas e diferentes para a Comissão.

Quais são?

Participação da mulher na política, empreendedorismo feminino e mulher na educação. Estamos construindo um planejamento para definir os temas de debate e as ações a cada mês. Está sendo uma experiência muito legal, em que deputadas e deputados têm se envolvido muito. E é importante salientar que temos muitos deputados ajudando, homens muito ativos  participando da comissão, o que mostra que essa não é uma pauta só das mulheres.  [/vc_column_text][vc_column_text]*Vitória Régia da Silva é repórter da Gênero e Número

Vitória Régia da Silva

É jornalista formada pela ECO/UFRJ e pós graduanda em Escrita Criativa, Roteiro e Multiplataforma pela Novoeste. Além de jornalista, também atua na área de pesquisa e roteiro para podcast e documentário. É Presidente e Diretora de Conteúdo da Associação Gênero e Número, onde trabalha há mais de sete anos. Já escreveu reportagens e artigos em diversos veículos no Brasil e no exterior, como o HuffPost Brasil, I hate flash, SPEX (Alemanha) e Gucci Equilibrium. É uma das autoras do livro "Capitolina: o mundo é das garotas" [ed. Seguinte] e colaborou com o livro "Explosão Feminista" [Ed. Companhia das Letras] de Heloisa Buarque de Holanda.

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