Lula presidente: choro e celebração

Foi ao som de “Trenzinho Caipira” que Lula subiu a rampa do planalto pela terceira vez. Dentro do Senado, cercada de jornalistas que engoliam emoção, satisfação ou conformação, não me permiti chorar. Mas trabalho num veículo que tem lado e onde posso rabiscar essas palavras. Me lembrei de quando comemorei a vitória de Dilma, sozinha, dentro da cabine do banheiro da Rádio CBN, em 2010. Merval Pereira estava na cobertura com a gente.

Sou crítica de Lula desde sempre. Vejo nele mil questões. Mas acompanhei sua prisão em São Bernardo do Campo, o conheci no Senado da Argentina, no dia da morte de Videla, quando fomos clicados em um abraço amistoso pelo “Stukinha”. Sou tiete de Dilma, que não se curvou ao Centrão e deixava seus homens velhos brancos na antessala esperando por três horas. E não os recebia. Ela ainda não teve a reparação histórica definitiva, que Lula obteve hoje. E não sei se terá. 

O Brasil nunca esteve preparado para Dilma | Foto: Roberto Stuckert Filho

O Brasil sobe a rampa do Planalto

Hoje, mulheres, pretos, pessoas com deficiência, a cachorrinha Resistência e o cacique Raoni (aos 90!) subiram a rampa do Planalto com Lula, ao som do “Trenzinho”, executado por uma banda de militares (pois é). Bolsonaro não estava lá para intoxicar o ambiente. Quem passou a faixa a Lula não foi Dilma — o que seria justo, mas intragável para parte da imprensa e o Centrão — mas uma catadora preta. Na Esplanada, além do vermelho predominante, havia mais preto, mais marrom, arco-íris, e verde e amarelo também. 

A trégua, a lua-de-mel, acaba nesta segunda, 2 de janeiro. Lula vai cuidar de um país destruído por Eduardo Cunha, Temer e Bolsonaro. Mas, no seu discurso, indígenas, pretos, pobres, famintos estavam presentes. E são eles que importam. 

Choremos, oremos, celebremos, trabalhemos. Feliz ano novo.

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Maria Martha Bruno

Jornalista multimídia, com experiência na cobertura de política e cultura, integra a equipe da Gênero e Número desde 2018. Durante três anos, foi produtora da NBC News, onde trabalhou majoritariamente para o principal noticiário da emissora, o “NBC Nightly News”. Entre 2016 e 2020, colaborou com a Al Jazeera English, como produtora de TV. Foi repórter e editora da Rádio CBN e correspondente do UOL em Buenos Aires. Jornalista pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, é mestre em Comunicação e Cultura pela mesma instituição, e atualmente cursa o programa de Doutorado em Comunicação na Texas A&M University, nos EUA.

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