Manuela D'Ávila e Fernando Haddad na sede do PCdoB. Foto: Ricardo Stucker

Vices sim, protagonistas também: mulheres em chapas presidenciais não querem cargo decorativo

Numa semana agitada e decisiva na formação de chapas, presidenciáveis correm atrás dos votos femininos com candidatas mulheres; no discurso delas, o tom é de construção conjunta, lado a lado

Por Vitória Régia da Silva*

Vitória Régia da Silva

  • Pré-candidatas à vice-presidência

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  • Manuela D’Avila: a voz feminina na tríplice aliança

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  • #ManuelaSofreuMachismo?

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Nos últimos dias, as chapas à presidência se tornaram o principal assunto na corrida eleitoral,  e cinco mulheres estão nas composições como pré-candidatas à vice-presidência. Sônia Guajajara (PSOL), como vice de Guilherme Boulos (PSOL);  Ana Amélia Lemos (PP), vice de Geraldo Alckmin (PSDB); Kátia Abreu (PDT), vice de Ciro Gomes (PDT);  Suelene Balduino (Patriota), vice do Cabo Daciolo (Patriota) e Manuela D’Ávila (PCdoB), vice na chapa “tripla” de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com Fernando Haddad (PT). Além das duas pré-candidatas à Presidência: Marina Silva (Rede) e Vera Lúcia (PSTU).

Outros candidatos que tentaram uma aproximação com mulheres para o cargo mas não saíram com uma aliança foram Jair Bolsonaro (PSL) e Henrique Meirelles (MDB), que buscaram a advogada Janaína Paschoal e a senadora Marta Suplicy (MDB/SP), respectivamente. Bolsonaro anunciou na última semana o general Antônio Hamilton Mourão (PRTB) como vice na sua chapa. Já Meirelles vai com o ex-governador do Rio Grande do Sul Germano Rigotto (MDB) para o cargo.

“A participação de mais mulheres nessa disputa é um avanço. Embora não tenhamos a maioria da titularidade sendo ocupada por mulheres, já existe essa preocupação dentro dos partidos de que tem que garantir a presença das mulheres”, comentou Sônia Guajajara (PSOL) à Gênero e Número. “A definição das candidaturas, trazendo a preocupação de trazer uma mulher como vice, significa que não dá mais para fazer política sem nós.”

Liderança indígena, Guajajara, ao contrário das outras candidatas, não se coloca como candidata à vice-presidência, mas como copresidenta: “não queremos reproduzir a figura do vice decorativo, mas [queremos] que tenha uma participação igualitária nas atribuições do governo”.

Sônia Guajajara recusa o título de vice e se coloca como candidata a copresidência ao lado de Guilherme Boulos (PSOL). Foto: Divulgação/Facebook

[+] Veja também: Sônia Guajajara: “Como mulher, sem dúvida, vou marcar posição e falar dessa representatividade”

Segundo pesquisa do Instituto Datafolha divulgada em 9 de julho, um terço do eleitorado brasileiro ainda não definiu de quem será seu voto para a Presidência. A indefinição é maior entre as mulheres do que entre os homens, indicando que a escolha delas pode ter um peso importante para definir o cenário eleitoral. Se a eleição presidencial tivesse ocorrido no início de junho e sem Lula (PT), 41% das eleitoras brasileiras não teriam escolhido qualquer candidato. Já no caso dos homens, esse percentual cai para 25%, segundo o Datafolha.

Os dados que mostram que as mulheres são maioria entre os eleitores indecisos estimula os pré-candidatos à Presidência a procurar mulheres para compor a chapa para as eleições deste ano e ocupar o Palácio do Jaburu.

A representatividade das mulheres na política formal brasileira ainda é muito baixa, tanto no Legislativo quanto no Executivo, muito embora elas representem 52% do eleitorado brasileiro, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). As mulheres ocupam 54 das 513 cadeiras da Câmara de Deputados, a segunda menor taxa de representatividade em parlamentos na América Latina, e o debate sobre essa presença e sobre o protagonismo delas na política está no centro das reivindicações sobre direitos das mulheres. 

Pré-candidatas à vice-presidência

A senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS) foi anunciada na quinta-feira (02/08) como candidata a vice-presidente na chapa de Geraldo Alckmin (PSDB). A parlamentar gaúcha de 73 anos é formada em Comunicação Social e foi eleita para o Senado em 2010. Em 2014, ela disputou o governo gaúcho e ficou em terceiro lugar.

A indicação da senadora consolida a formação de uma ampla aliança em torno de Alckmin, composta até o momento por nove partidos da centro-direita, o chamado “centrão”. “Ana Amélia tem fibra e posições firmes. É uma apaixonada pelo trabalho, como mostra a sua assiduidade nas sessões do Senado”, publicou a equipe de Alckmin no perfil do candidato no Facebook. “Ana Amélia também traz à nossa chapa o olhar da mulher brasileira, sempre lutadora e cada vez mais ativa na busca pela igualdade que é sua de direito. Com Ana Amélia ao nosso lado, vamos acelerar os esforços para ampliar o espaço da mulher no mercado de trabalho, no serviço público e na política. Termos mais mulheres líderes.”  

Em um vídeo publicado em seus perfis nas redes sociais no dia seguinte à formação da chapa, a senadora afirmou que não foi uma decisão fácil a candidatura à vice-presidência, pois “teve a coragem de abrir mão da reeleição no Senado quase certa para um resultado eleitoral incerto”. Ela também disse que nunca teve medo de desafios e que “como mulher, que ainda é minoria na política, não me curvo às pressões de quem quer que seja.”

Senadora Ana Amélia desiste de tentar reeleição no Senado para compor chapa presidencial ao lado de Geraldo Alckmin. Foto: divulgação/Facebook

Outra candidatura a vice anunciada nesta semana foi a da senadora Kátia Abreu (PDT). Com trajetória ligada ao setor ruralista, ela foi contrária ao impeachment de Dilma Rousseff, de quem foi ministra da Agricultura. O ex-governador do Ceará Ciro Gomes, que encabeça a chapa, disputará a eleição pelo Palácio do Planalto coligado apenas com mais um partido, o Avante, após não ter tido sucesso nas negociações com os partidos do centrão e com o PSB e também ter perdido a chance de fechar com o PCdoB – que apoia a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Estou obstinada a enfrentar mais um desafio na minha vida, que talvez seja um dos maiores (…). Agradeço a Ciro Gomes por entender que posso fazer parte dessa caminhada, sendo uma mulher, vinda do Estado mais novo do país, Tocantins, e todos nós nos sentimos muito honrados em estar na sua chapa”, disse a Abreu durante o anúncio oficial da chapa presidencial do PDT no domingo (05/08).

A senadora e ex-ministra da Agricultura disputará a eleição pelo Palácio do Planalto ao lado de Ciro Gomes (PDT)

Manuela D’Avila: a voz feminina na tríplice aliança

Foi fechada “de última hora” a negociação definindo que a deputada estadual do Rio Grande do Sul Manuela D’Ávila (PCdoB), previamente anunciada como pré-candidata à Presidência, desistiria da sua candidatura e seria vice na chapa do PT. A chapa encabeçada por Lula e que tem os nomes do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e da deputada gaúcha foi batizada nas redes sociais de “chapa triplex”, em alusão ao apartamento triplex do Guarujá pelo qual o ex-presidente se encontra na prisão. Caso a candidatura de Lula seja aceita, a Manuela entraria no lugar de Haddad como vice-presidente; se não o for, ela será a candidata a vice do exprefeito paulistano.

A nota do PCdoB divulgada nesta segunda-feira (06/08) afirma que o processo de decisão da direção nacional que optou pela coligação com o PT teve o objetivo de criar uma frente ampla de esquerda para “conquistar a vitória das forças progressistas nas eleições presidenciais”.

“Seria quase um luxo manter minha candidatura e não reunir, aglutinar mais forças para vencermos as eleições. Juntos temos mais força e condições de vencer o pleito”, disse D’Ávila em pronunciamento oficial na sede do PCdoB, ao lado de Fernando Haddad, no centro de São Paulo, na terça (07/08).

#ManuelaSofreuMachismo?

Circula nas redes sociais uma hashtag irônica promovida por grupos e perfis opositores à chapa PT/PCdoB que tentaram promover a narrativa de que Manuela foi vítima de machismo ao deixar de ser candidata à Presidência para formar uma aliança e ser candidata a vice. Através da hashtag #ManuelaSofreuMachismo, internautas alfinetam a desistência, relembrando, por exemplo, a participação dela no programa Roda Viva, quando a candidata e seus apoiadores sustentaram que as interrupções constantes dos entrevistadores foram exemplos de machismo.

Questionada por jornalistas durante o pronunciamento na sede do PCdoB, Manuela respondeu sobre a hashtag e as críticas: “Na lógica dos machistas, uma mulher como eu, presidida por outra mulher, Luciana Santos, não teria condições de fazer debates políticos com os partidos e me indicarem como candidata a vice (…). Quando alguém do meu próprio Estado foi indicada a vice do Alckmin, ter uma mulher na chapa foi motivo de festa. Quando uma mulher é indicada a vice do primeiro candidato nas pesquisas, dizem que isso é machismo”. Para Manuela, machismo é não respeitarem suas decisões, e as críticas são reflexo do “medo de ter uma mulher na vice-presidência da República, que é o que vai acontecer”.

Vitória Régia da Silva

É jornalista formada pela ECO/UFRJ e pós graduanda em Escrita Criativa, Roteiro e Multiplataforma pela Novoeste. Além de jornalista, também atua na área de pesquisa e roteiro para podcast e documentário. É Presidente e Diretora de Conteúdo da Associação Gênero e Número, onde trabalha há mais de sete anos. Já escreveu reportagens e artigos em diversos veículos no Brasil e no exterior, como o HuffPost Brasil, I hate flash, SPEX (Alemanha) e Gucci Equilibrium. É uma das autoras do livro "Capitolina: o mundo é das garotas" [ed. Seguinte] e colaborou com o livro "Explosão Feminista" [Ed. Companhia das Letras] de Heloisa Buarque de Holanda.

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