Tatiana Roque, no lançamento da sua pré-candidatura no Rio de Janeiro. Foto: Divulgação

NOVOS NOMES: “Eu tenho essa capacidade de diálogo, e minha campanha fala sobre isso”, afirma Tatiana Roque

A newsletter Política 2018 traz a cada edição quinzenal o perfil de uma mulher que disputará as eleições pela primeira vez em 2018

Por Giulliana Bianconi*

Vitória Régia da Silva

  • 1. A trajetória política recente na universidade

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  • 2. Pauta principal: educação e ciência para todos

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  • 3. Segunda pauta: sobre mulheres na política

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  • 4. Trabalho, a terceira pauta de Tatiana Roque

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  • 5. Capacidade de diálogo a partir da esquerda

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Na semana em que a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) alertou o Brasil para um dos momentos mais críticos pelos quais passa a ciência no país, a Gênero e Número abre espaço na seção “Novos Nomes” para pesquisadora e candidata à deputada federal Tatiana Roque (PSOL), do Rio de Janeiro. Tarimbada na Matemática, Roque, professora do Instituto de Matemática/UFRJ, doutora na área de História e Filosofia das Ciências pela Coppe/UFRJ, já fez muita política na universidade. É uma voz ativa no debate sobre direitos na educação pública. Reconhecida como liderança, em 2015 assumiu a direção do sindicato docente da UFRJ, num momento de forte disputa de narrativas sobre modelos viáveis de universidade pública no país. Não é difícil encontrar artigos escritos por ela na grande mídia, ora defendendo o ensino gratuito, ora defendendo cotas raciais. 

Filha de militante político morto em 1973 durante a ditadura militar (Lincoln Bicalho Roque), Tatiana esteve sempre à esquerda no espectro político, mas afirma que até 2016 não pensava sobre disputar espaço na política formal. O impeachment da então presidenta Dilma Rousseff abalou sua percepção de que não seria por via da representação parlamentar que as mudanças poderiam acontecer no país. “Aquele 17 de abril de 2016, com aquele Congresso Nacional votando da forma que votou [o impeachment]… aquilo foi didático, acho que ninguém que tem atuação política e que defende pautas da esquerda conseguiu seguir em frente sem rever essa necessidade de se disputar cadeiras”, diz ela. Nova no PSOL, partido pelo qual lançou sua primeira candidatura, Roque entra na corrida eleitoral à Câmara dos Deputados com três pautas principais.

Confira abaixo mais da trajetória e conheça as pautas da candidata.

1. A trajetória política recente na universidade

“Já na vida universitária, o momento mais forte dessa minha politização foi quando a universidade começou a se democratizar fortemente, logo no início do Governo Lula, em 2003. Eu comecei a participar de vários movimentos que eram a favor dessa democratização, das cotas, da expansão. E sempre estive muito a favor disso, mas a esquerda não era toda a favor disso, havia e há uma esquerda contra cotas. Existia esse conflito real. E entendo que comecei a me destacar ali. Havia gente querendo fazer greves que eram até contra essas políticas propostas pelo governo Lula, mas o grupo do qual eu fazia parte pensava que aquele não era o caminho. Até que em 2015 houve uma greve, feita pela então direção do sindicato, era época já do governo Dilma. Uma greve para pressionar o governo. O grupo do que eu fazia parte foi contra a greve e eu me fortaleci, pois fui uma porta-voz no movimento de resistência àquilo e acabei eleita presidente do sindicato dos professores da UFRJ naquele ano, em uma chapa que ganhou com muita vantagem.

Também foi um período em que precisamos falar muito, um momento terrível, que seguiu até o golpe [o impeachment de Dilma Rousseff]. Então precisamos fazer muita coisa. Precisamos inventar novas formas de luta, pois não era um momento para greves. A gente se aproximou das sociedades científicas, a gente instalou o tesourômetro na Praia Vermelha [Urca, zona sul do Rio de Janeiro], fizemos audiência pública na Câmara dos Deputados com petição. Vivíamos em Brasília. Produzimos muitos artigos pra grande mídia, pois é importante fazer essa batalha nas grandes mídias. Nessa luta tive um certo destaque e fui vista como liderança. Não refuguei ora alguma, fui assumindo esse desafio. Eu comecei a receber então vários convites pra me candidatar. Acabei indo para o PSOL. Escolhi essa legenda porque é um partido muito identificado com a esquerda, e minhas pautas são de esquerda. O PSOL tem muitos quadros diferentes, gosto disso. Tem gente com quem eu concordo mais, com quem eu discordo, mas tem quadros muito combativos.”

2. Pauta principal: educação e ciência para todos

“Minha pauta principal é a defesa da universidade pública e gratuita, contra a cobrança de mensalidades, a favor da expansão, e no mínimo da manutenção do investimento para a universidade se mantenha como ela é hoje, com acesso democrático para negros, pobres, alunos de escola pública, indígenas, com todos os coletivos que existem hoje de mulheres, de negros. Acho isso [os coletivos] uma riqueza sem tamanho, uma novidade impressionante num país como o Brasil, tão desigual. Mas para que essas pessoas realmente tenham igualdade de condições para se manter na universidade, elas precisam de políticas permanentes: de bolsas, bandejão, cotas, transporte, isso é essencial. Muita coisa foi cortada nos últimos anos e há uma ameaça de mais cortes sempre. Pra gente conquistar a opinião ampla da sociedade e consolidar a universidade pública democrática e inclusiva, a gente precisa gerir melhor a universidade. A sociedade tem uma percepção de que há muito desperdício. Reconheço que não existe uma preocupação de mostrar constantemente como esse dinheiro retorna. Essa é uma crítica que a gente tem que fazer.”

3. Segunda pauta: sobre mulheres na política

“A representatividade das mulheres no parlamento precisa ser discutida de forma mais afirmativa, com a defesa de reservas nas cadeiras. As mulheres e os movimentos de mulheres estão falando muito sobre representatividade, temos lei que determina número mínimo de candidatas para gêneros diferentes, mas precisamos ir além, e entendo que essa pauta da reserva do número de cadeiras precisa ser mais discutida e evidenciada. Podemos e devemos mobilizar mais por isso. Na minha opinião, os projetos de lei que tentaram avançar com essa pauta no Congresso ficaram no meio do caminho também por falta de pressão.”

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Tatiana Roque, atuação na universidade para além da docência

4. Trabalho, a terceira pauta de Tatiana Roque

Eu venho estudando, inclusive na Filosofia, as mudanças no mundo do trabalho. Passamos por mudanças profundas no mundo do trabalho. Não adianta a gente continuar defendendo um sistema de proteção social que vincula tudo a um emprego, a gente vai ter que pensar um sistema de proteção social levando em conta também um trabalho automatizado, robotizado, mais intermitente, mais flexível, e para isso a gente precisa refundar nosso sistema de proteção social para incluir esses novos tipos de trabalhadores. O início para isso, um ponto de partida, é a discussão e o avanço da proposta da renda básica universal. Tenho defendido isso, sim. Avançar nisso por etapas, mas tenho defendido. Essa pauta, inclusive, tem muito a ver com o debate de gênero, das mulheres, pois a renda básica universal não é apenas uma forma de combater a pobreza ou a desigualdade, é uma forma de remunerar o trabalho não pago. E as mulheres sabem como ninguém o que significa isso. Então penso que precisamos tirar o debate sobre direitos apenas do foco da carteira assinada e trazer pra essa perspectiva mais ampla, considerando o trabalho invisível.”

5. Capacidade de diálogo a partir da esquerda

“Eu tenho essa capacidade de diálogo, e minha campanha, da forma como vem sendo articulada, fala sobre isso. Eu trago pessoas que historicamente estavam alinhadas ao PT, mas que conseguem dialogar com outras formas de pensar as pautas de esquerda, que não são apenas as formas do PT, e mais do que isso, que enxergam onde estão as demandas que não são, historicamente, apenas da esquerda. Precisamos muito avançar nessa esquerda que dialoga, que tem projeto realista, que tem projeto concreto, não é sectária, que se coloca num lugar de  vanguarda e não fala a partir de uma superioridade. A gente quer ganhar as pessoas, isso é preciso e necessário. Temos que trazer as pessoas pra perto. Nessa batalha de narrativas, os liberais estão ganhando. Eles vão lá e fazem estudo, criam site, criam Think and Tank, página no Facebook e vão dialogando com mais gente. Muitas vezes, sim, eles têm mais dinheiro, mas a gente pode fazer. Dá pra fazer. No sindicato [de professores da UFRJ] a gente fez, funcionou um pouco como Think and Tank o nosso trabalho. Por exemplo, na PEC do Teto dos Gastos, a gente produziu muito material explicitando um pouco o que que era aquilo. Perguntas e respostas, coisas didáticas, desde memes até panfletos, passando por artigos em jornais. Acho que a defesa que a grande mídia estava fazendo sobre a cobrança de mensalidade nas universidades inclusive arrefeceu também por causa da nossa atuação.”

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*Giulliana Bianconi é codiretora da Gênero e Número

Vitória Régia da Silva

É jornalista formada pela ECO/UFRJ e pós graduanda em Escrita Criativa, Roteiro e Multiplataforma pela Novoeste. Além de jornalista, também atua na área de pesquisa e roteiro para podcast e documentário. É Presidente e Diretora de Conteúdo da Associação Gênero e Número, onde trabalha há mais de sete anos. Já escreveu reportagens e artigos em diversos veículos no Brasil e no exterior, como o HuffPost Brasil, I hate flash, SPEX (Alemanha) e Gucci Equilibrium. É uma das autoras do livro "Capitolina: o mundo é das garotas" [ed. Seguinte] e colaborou com o livro "Explosão Feminista" [Ed. Companhia das Letras] de Heloisa Buarque de Holanda.

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