Encontro internacional para definir pautas no documento aconteceu em São Paulo, em novembro de 2019 | Foto: Zalika Produções

Coalizão Negra por Direitos lança manifesto com estímulo a candidaturas em 2020 e inicia atuação internacional

Documento é assinado por 150 entidades ligadas aos movimentos negros; grupo denunciou governos do Rio e de São Paulo à Organização dos Estados Americanos

Por Maria Martha Bruno e Lola Ferreira*

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Organizado no primeiro ano de governo de Jair Bolsonaro, a Coalizão Negra por Direitos tornou público semana passada seu manifesto com 25 exigências de melhorias nos campos social e econômico para negros do país. O movimento suprapartidário e nacional é  formado por coletivos e organizações que já atuam em prol de pautas fundamentais à população negra. A agenda abarca, também, o incentivo a candidaturas de pessoas negras e comprometidas com os direitos humanos. 

O documento, assinado por 150 grupos ligados às agendas da população negra, explica que a Coalizão foi motivada “pela prática cotidiana de assassinatos de um jovem negro a cada 23 minutos; chacinas diárias; estado penal e encarceramento crescentes e com muita violência contra população carcerária e internos dos sistemas sócio educativos; assassinato da população negra LGBTTQI+ e crescentes números de feminicídio de mulheres negras”, entre outras razões. 

Douglas Belchior, um dos representantes da Coalizão, explica que as organizações envolvidas já têm atuação a nível local, estadual, nacional e, inclusive, já iniciou sua atuação internacional. “Inauguramos nossas ações este ano denunciando à OEA os governos do Rio de Janeiro e de São Paulo por suas políticas de segurança pública. O Rio, pelas ações nas favelas, e São Paulo, pelo caso específico do massacre de Paraisópolis. Também devemos participar de reunião da Comissão de Direitos Humanos da ONU, em março, levando estas denúncias”, diz Belchior.  

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No Brasil, a articulação direta com políticos, em todas as esferas, não está descartada e é, inclusive, incentivada. “Além do trabalho permanente de mobilização que essas organizações já fazem, essa unidade da Coalizão garante uma capacidade de legitimidade de atuação política nos espaços de poder, como câmaras municipais, assembleias legislativas e no Congresso Nacional, como a gente já fez no ano passado. Ir no corpo a corpo, dialogar com deputados, participar de comissões, judicializar processos quando necessário e, também, levar denúncias aos fóruns internacionais”, explica Belchior.

A atuação na política institucional também poderá se dar por outros meios. De acordo com Belchior, uma das metas é colocar no poder defensores dos direitos humanos negros. “Não basta ser negro. Não se trata apenas de eleger com representatividade, mas sim pessoas comprometidas com a nossa pauta. É fundamental eleger candidatos e candidatas que defendam essas agendas, que tenham uma vida ligada aos movimentos e que seus mandatos sejam instrumentos de fortalecimento da defesa do projeto do povo negro para o Brasil”, afirma.

Segurança e economia

Lúcia Xavier, coordenadora da ONG Criola, uma das organizações que integram o movimento, explica outra atuação principal da coalizão em 2020: a luta por melhores políticas de segurança e de economia. 

“A coalizão nasce impulsionada para enfrentar o pacote Moro [pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública], enfrentar o fim das cotas raciais, bater firme nas políticas de recessão e também nas políticas de segurança. Elas fazem parte de um pacote de medidas judiciais que simplesmente fortalecem uma perspectiva de vulnerabilidade da população encarcerada”, analisa.

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Sobre as eleições, a coordenadora da ONG avalia que a exclusão de negros dos centros decisórios de poder também é uma face do racismo, e a Coalizão luta para cessar isto. “É preciso dizer às autoridades, aos setores da sociedade, aos poderes instituídos que nós fazemos parte dessa sociedade e nós queremos também tomar decisões sobre ela. Não somos em absoluto um grupo sem condição de interferir no processo político. Este é o suprassumo do processo racista, que enxerga negros como inferiores.”

Para incidir, os grupos tiveram de se unir. E Xavier explica que a união das organizações que compõem a coalizão se deu por um motivo específico: “Sozinhas elas estão fragilizadas face ao processo de violência do Estado. Então juntos somos mais fortes”.

*Maria Martha Bruno é editora e Lola Ferreira é repórter da Gênero e Número

Lola Ferreira

Formada pela PUC-Rio, foi fellow 2021 do programa Dart Center for Journalism & Trauma, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Escreveu o manual de "Boas Práticas na Cobertura da Violência Contra a Mulher", publicado em Universa. Já passou por Gênero e Número, HuffPost Brasil, Record TV e Portal R7.

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